Especial Volta Redonda

Especial: Bastidores e curiosidades do show de Renato Russo em VR



Por André Aquino

Era uma noite chuvosa de sábado em 24 de novembro de 1990, em Volta Redonda. Renato Russo, líder da Legião Urbana, ficou hospedado no Hotel Bela Vista, num quarto em que a janela era a moldura da cidade. Não se encantou. Ele estava doente e acompanhado por um médico psiquiatra e de sua irmã, Carmen Tereza. A depressão deixa tudo cinza como o céu daquele histórico dia para o cenário musical da cidade.

Volta Redonda era a última apresentação da turnê “Quatro Estações”, no festival  “Estação Volta Redonda”. O evento na cidade teve mais 12 atrações, tinha como a principal banda a Legião. No auge do sucesso e do estrelismo, Renato se recusou a dividir palco com qualquer outra banda. A noite deveria ser só do Legião e, sem titubear, a organização do evento aceitou a exigência.

Nesta semana, o ícone do rock brasileiro completaria 59 anos de vida (27 de março). Para comemorar essa data, o TRIBUNA produz a reportagem especial aos fãs e nela conteremos momentos inéditos (ou curiosidades) sobre o show da banda em Volta Redonda. Os bastidores, o estado de espírito de Renato, a visão de fãs e de jornalistas naquela época.

Renato queria cancelar o show

Durante todo o dia, a chuva caia sem parar em Volta Redonda. O clima seria um ótimo pretexto para que o Renato Russo não encarasse o público no momento em que ele passava por uma tempestade interna.

“Fiquei o dia inteiro trancado no quarto hotel (…) Me lembro que rezava para que chovesse ainda mais e show fosse cancelado, já que não queria enfrentar o público”, relata Renato Russo, no livro “Memória de um Legionário”, de Dado Vila-Lobos.

Não tinha jeito. Legião tinha que tocar naquela noite. Dado Vila Lobos, guitarrista da banda, tinha sentidos fortes dores nas regiões íntimas do corpo e médico de Renato receitou um analgésico para conseguir subir ao palco.

“Quando estava eles hospedados, vi Renato Russo apenas duas vezes. Ele ficava trancado no quarto. Me lembro ter levado pelo menos dez toalhas ao quarto. Ele suava muito e nariz sempre escorrendo. Não conversamos uma palavra”, disse Rita de Cássia, que na época tinha apenas 18 anos e começava sua vida profissional no hotel.

“Mas, ter visto me bastava. Era e sou muito fã deles. Não fui ao show porque estava trabalhando, mas minha amigas ficaram com inveja daquele meu contato”, conta Rita, que hoje está com 46 anos e morando no Rio.

Sem passagem de som

A chuva não permitiu que houvesse a passagem do som, um teste que ocorre antes de shows. Então, Renato decidiu que seria feita na primeira música do show. Eles tocaram foi “A Whiter Shade of Pale”, de John Lennon, para passar o som.

“Me lembro que ele entrou completamente transtornado no palco”, relembra o jornalista Luciano Pançardes, numa entrevista ao músico Figurótico, no Youtube.

Cobertura de repórter-fã  

A banda de Renato Russo estava no auge do sucesso. E o jornalista Francisco Edson Alves foi escalado para cobrir o show pelo jornal A Voz da Cidade.

“Pouco antes do show, me lembro de um dos assessores dizendo: ‘Ele não vai receber ninguém no camarim. Vocês têm que tentar abordar o pessoal da banda na passagem para o palco. Mas vou logo avisando: o Renato tá doidaço de uísque. Postado à frente da porta do camarim, meu coração disparou quando a porta se abriu e eu, instintivamente fui na direção de Renato. ‘Renato, Renato, você pode falar com a gente?’. Ele olhou e foi passando sem falar nada. Aí, meu lado de fã e repórter iniciante ao mesmo tempo falou mais alto. Pulei na frente dele e mandei: ‘Então me dá um autógrafo?’. Mas ele ignorou meu apelo e subiu ao palco”, relatou Alves, que hoje é jornalista do Jornal O Dia, no Rio.

Ele continuou: “Depois de cumprimentar o público, que lotava o gramado, Renato, rindo muito, emendou: “Vocês são engraçados, sabia? Até repórter daqui pede: `Moço, me dá um autógrafooooo´?”. O público foi à loucura. E eu, feliz da vida, mesmo tendo pagado aquele mico, falei com Luciano: “Caramba!!! Ele tá falando de mim. Uhuuuu!”.

 Rosas de Renato Russo

No meio do show, Renato atirou a rosa (a foto acima) que ele segurava para o público, mas ela caiu nas minhas mãos. “Eu estava na frente do palco, no lugar reservado à imprensa. Fiquei extasiado. De repente, Luciano gritou no meu ouvido. ‘Cara, olha para trás. O público quer a rosa’. Os seguranças estavam tendo dificuldades para conter a multidão, que alegava que a rosa era para os fãs. Mas, poxa, pensei, ‘também sou fá e isso é histórico!’”

Amor, toalhas e água de coco

 

Junto com Francisco Edson Alves, Luciano Pançardes também estava na cobertura do show. Ele relembra a movimentação nos bastidores do show. “Renato pediu água de côco e cara vinha com uns quatro, abria e ele provava e jogava fora. Ai, veio um que ele provou e gostou. Ele não permitiu que ninguém entrasse no camarim e dezenas de toalhas”, contou o jornalista.

Renato veio à Volta Redonda também com um namorado americano o americano Robert Scott Hickmon (“loirinho, cara de estivador”, “um gay de carteirinha”, conforme explicou à extinta revista gay Sui Generis). Com ele, entrou em sua fase de consumo de heroína.

Dois mil cruzeiros

O ingresso do show custava dois mil cruzeiros (algo em torno de R$ 50 hoje) e a venda antecipada acontecia na agência do Banerj, na Avenida Amaral Peixoto. A prefeitura de Volta Redonda, na administração polêmica de Wanildo de Carvalho, foi quem contratou o show e o dinheiro arrecado no festival seria destinado para a construção da Biblioteca Municipal, na Vila Santa Cecília.

Mesmo doente e depressivo, o show durou duas horas e a chuva tornou-se insignificante para aqueles seis mil jovens que viveram o momento histórico numa noite de primavera de 1990.



24 Comentários

    • Leandro 15:23

      Excelente matéria…que venha mais como essa. Parabéns!

      • Bruno Bolonha 18:45

        Nossa! A muito tempo não via uma matéria tão boa…. Que contagia e ao ler posso sentir como se estivesse lá! Obrigado por compartilhar esse momento tão mágico! Parabéns!

      • Lacy 22:00

        Muito boa a matéria.
        Me lembro como se fosse ontem. Recém casada compramos capas de chuva só para participar do show.
        Ele ainda voltou ao palco para cantar mais para a plateia que delirava.
        Foi neste dia que ele assumiu a sua homossexualidade ao público revelando ter feito a música para
        o ex namoraDO Maurício, música do mesmo nome.
        Na última sílaba ele pronunciou com veemência.
        Esse ato em VR foi pauta em muitas revistas e jornais do Brasil citando a nossa cidade.

    • Vanice 15:28

      Lendo tudo isso,me deu arrepios!
      Sou fã de Renato Russo. Me lembro,que em 1988,meus vizinhos,no Retiro (que gostavam do Legião Urbana),ficávamos em minha casa, ouvindo disco de vinil… cantávamos juntos todas as músicas. Ai que saudades boa! Pena,que não fui no show! Só de imaginar a cena da rosa… Tudo maravilhoso! Pra quem é fã,tudo passa! Tudo passará!

    • claudio cardoso de soua 16:40

      Certa vez estava em um bar de Volta Redonda, eu tinha sim ido ao show ..vi uma filmagem referente ao show ….sempre procurei ,mas ninguem adicionou a internet……lembro que choveu muito sim !!!! e que a galera vinha correndo e escorregava no gramado, isso pra não falar do show…..hoje conto para meus filhos a alegria de ter ido ao show do Legião dizendo ” eu vi ao vivo!!!”

      • Maria felicio 11:24

        Estive no show, foi divino, sem palavras para um tremendo espetáculo que a banda nos proporcionou.
        O Renato naquela seriedade que lhe pertencia e ao mesmo tempo levando os jovens ao delírio com sua calma e seu talento abençoado por Deus que era demais.

    • Thiago Víctor de Queiroz Freitas 17:31

      A legião urbana vive ???

    • Téo Jesus 17:41

      A legião urbana será sempre eternizada pelos fãs a cada dia, e em geração e geração. Mesmo depois dos 23 anos sem o Renato, ele e a banda é lembrada contante e abundantemente crescendo mais ainda os legionários. “Força sempre”

    • Carlos 17:43

      Fui um dos sortudos vivo isso

    • Luiz Alberto 18:28

      Que matéria, que qualidade! Aliás, devo elogiar todo o jornalismo da Tribuna Sul Fluminense, sempre atualizando as informações e agora me vem com matérias super interessantes. O jornalismo do sul fluminense ainda respira.

    • Bruno Bolonha 18:46

      Nossa! A muito tempo não via uma matéria tão boa…. Que contagia e ao ler posso sentir como se estivesse lá! Obrigado por compartilhar esse momento tão mágico! Parabéns!

    • Élido Rodrigues 20:05

      O Brasil está sentindo falta da Renato ,sua música , letra e pensamento!! Mais do que nunca!! Força Sempre ! Não só facismo , Sim ao Amor!

    • Edmilson Pereira Costa 20:14

      Inveja branca…. a melhor banda de todos os temos…. música simples Boa de ouvir com grandes mensagens….

    • ANTONIO CARLOS DA COSTA 00:18

      Não lembro do Lennon ter cantado alguma vez a whiter shade of pale

      • Luciano.. 09:17

        Cara sou de brasilia .
        Top. Essa materia..
        Sou fã do legiaõ…
        Inesquecivelll.✌

    • Vizinhos 00:51

      Eu estava lá e foi muito f_ _ _. Nunca esquecerei

    • Renata Nery de Assis Lemos 04:08

      Eu sempre ouvi falar que nesse show os equipamentos de som deles queimaram, por conta da chuva torrencial. Isso não aconteceu? É lenda? Pelo menos na matéria não cita nada sobre isso. Obrigada!

    • Nelson Garcia 08:01

      Finalmente uma matéria sobre esse grande dia. Me lembro de cada deram aí contado. Ele tava muito doido mesmo. E a chuva não dava trégua. Fui eu e mais uma galera que trabalhava comigo na Mesbla! Legião for ever ❤️❤️❤️

    • Valeria 10:41

      Eu estava nesse show. Lembro dos boatos na cidade, que o estádio não ia suportar tanta gente, as arquibancadas eram de madeira. Muita gente ficou com medo de ir. Eu e minha há amiga compramos o ingresso na porta do estádios e foi um momento ímpar, assistir aquele show. Pena que não tem tantos registros de fotos e vídeos.

    • Luciano 10:58

      Gente, quanta idolatria, ele não era Deus!

    • Anderson Terra 13:25

      Fui o produtor desse show, organização da empresa do meu tio CARLOS Lincoln, falecido ano passado. Parabéns pela matéria, gostaria de acrescentar alguns detalhes de bastidores. Para garantir o show o empresário Rafael.Borges, pediu uma ambulância com oxigênio estacionada no hotel Bela Visa. Renato pediu canja antes do show. O som era passado pelos roadies Vitor , Marcelo e outro que não me recordo.A prefeitura na época não mediu esforços para.realizar o evento que.ficou marcado por uma imagem no telão. Assim que os portões foram abertos um jovem correu e mergulhou numa poça d’água. Rock na veia

    • Leitor do Vale 22:43

      Que venha mais matérias como essa, muito bem redigida! E esse jornal tá muito bom e atualizado.

    • Norberto Mendonça 05:04

      Maravilhoso,fui nesse show e mergulhei nas poças do gramado.Meu amigo minha da sessenta chorou quando começou o show.Custamos a acreditar que era verdade.Tempo bom.Que lembrança.

    • Luciana Louro 08:59

      Foi a melhor surra da minha vida,eu com 13 anos na época fugi pra assistir o show com o ingresso roubado do meu irmão,kkkkk.Show de lembranças.

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