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HOLLYWOOD, A CALDEIRA DO DIABO E OS ASSÉDIOS
Por Renan Maia



Tenho acompanhado as últimas notícias do mundo do cinema com uma mistura de sensações, que vão do cômico ao lamentável em minutos, conforme clico em links e eles me revelam diferentes lados de fatos similares. E no fim, vem aquelas bizarras seções de comentários de de gente de todo tipo querendo opinar. Especificamente, esta semana vieram várias reações durante e após a premiação do Globo de Ouro, que premia artistas de cinema e TV há mais de sete décadas. Enquanto a maioria parece apoiar o manifesto de mulheres (e homens) contra os abusos sexuais e as disparidades profissionais e salariais entre os gêneros, agora também passaram a se manifestar mais fortemente grupos (incluindo femininos) que acham tudo aquilo exagerado, um retrocesso moralista e por aí vai. Pensamentos conservadores e liberais se misturam num verdadeiro caldeirão global.

Mas, enfim, não pretendo me debruçar sobre o tema, mas aproveito isso como gancho para incluir na reflexão um filme das antigas que assisti dia desses graça a minha curiosidade por clássicos, sejam eles bem conhecidos ou esquecidos. A obra em questão se chama “A Caldeira do Diabo” (Peyton Place, 1957), título metafórico em português, nada a ver com o gênero terror. A película trata de uma típica e aparentemente perfeita cidade dos Estados Unidos na metade do século passado. Porém, a vida de seus moradores é repleta do melodrama e os conflitos que até hoje inspiram as telenovelas brasileiras.

 

 

E nada mais notável (e atual) na trama do que o dilema vivido por uma adolescente pobre que sofre constantes assédios do padrasto alcoólatra. Isso culmina no tão lamentável ato do estupro, cena que soa até discreta para os padrões atuais, porém, que revela a dor de lidar com o abuso durante e depois do ato em si, algo atemporável e inadmissível. Vale ressaltar que mesmo com vários personagens, é esta personagem que rouba o filme e o domina nos vinte minutos finais em uma cena de tribunal (algo, que por sinal, adoro ver em filmes).

Sim, um melodrama americano dos anos 1950 já retratava de forma madura a discriminação sexual e o abuso contra mulheres (especialmente as pobres).

Conforme lembrou, neste último Globo de Ouro, a muito bem-sucedida Oprah Winfrey (também uma vítima de estupro na infância), não podemos ignorar histórias como a de RECY TAYLOR, negra e pobre, sequestrada e abusada por seis homens brancos após sair da igreja com o filho em 1944.

E agora em 2018 ainda precisamos estar definindo o que pode e o que não pode em relação ao contato entre pessoas, não importa se de sexos diferentes ou do mesmo. Não se trata de colocar mulheres contra homens nem rotular ou dividir pessoas, mas apenas parar quando somos inconvenientes já é suficiente. Pior do que descobrir um problema é fingir que ele não existe.

Renan Maia é jornalista


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